Síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS)
é uma resposta inflamatória geral de causas diversas.
é uma resposta inflamatória geral de causas diversas.
Considera-se ser devido a citocinas (" tempestade de citocinas ")
SIRS pode ser diagnosticada quando dois ou mais dos seguintes estão presentes
(1) A freqüência cardíaca > 90 batimentos por minuto
(2) A temperatura corporal <36 ou> 38 ° C
(3) A hiperventilação (freqüência respiratória alta)> 20 respirações por minuto ou , sobre o gás de sangue, uma PaCO2 menor que 32 mm Hg
(4) contagem de células brancas do sangue<4000 células/mm3 ou> 12.000 células/mm3, ou a presença de mais de 10% de neutrófilos imaturos.
(1) A freqüência cardíaca > 90 batimentos por minuto
(2) A temperatura corporal <36 ou> 38 ° C
(3) A hiperventilação (freqüência respiratória alta)> 20 respirações por minuto ou , sobre o gás de sangue, uma PaCO2 menor que 32 mm Hg
(4) contagem de células brancas do sangue<4000 células/mm3 ou> 12.000 células/mm3, ou a presença de mais de 10% de neutrófilos imaturos.
SIRS prova + de infecção =sepse
INJÚRIA DA CÉLULA ENDOTELIAL NA CIRURGIA CARDIOVASCULAR
Publicação Original:
Endothelial Cell Injury in Cardiothoracic Surgery
Edward D. Verrier, MD and Edward M. Boyle, MD.
Division of Cardiothoracic Surgery, University of Washington, Seattle, Washington; USA.
Ann Thorac Surg 62, 915-22, 1996.
RESUMO
Durante a última década demonstrou-se que o endotélio desempenha um papel importante na regulação de diversas funções, como a permeabilidade da membrana, o transporte lipídico, o tonus vasomotor, a coagulação, a inflamação e a estrutura da parede vascular. Estas funções críticas do endotélio são extremamente sensíveis à injúria produzida por hipóxia, exposição às citocinas, endotoxinas, colesterol, nicotina, manipulação cirúrgica e forças hemodinâmicas. A injúria ativa as células endoteliais e altera o balanço dos seus fatores, resultando em potenciação da vasoconstrição, da coagulação, da adesão de leucócitos, e da proliferação de células musculares lisas. Estas respostas constituem mecanismos protetores; contudo, quando o estímulo é suficientemente intenso, as respostas podem ser exacerbadas, resultando em lesão tissular, redução da função de determinados órgãos e em atividade fibroproliferativa anormal. Descobertas recentes no campo da biologia vascular conduziram à uma melhor compreensão de muitas complicações da cirurgia cardiovascular. Em virtude do grande impacto que a disfunção da célula endotelial tem em pacientes com doenças cardiovasculares, temas pertinentes à biologia endotelial estão na vanguarda das pesquisas que irão afetar a prática atual e futura da cirurgia cardiotorácica.
INTRODUÇÃO
A importância do endotélio vascular em praticamente todos os aspectos da cirurgia cardiovascular tem sido cada vez mais reconhecida [1]. O endotélio vascular foi considerado uma simples barreira não trombogênica que separa o sangue dos tecidos. Os estudos das culturas de células endoteliais humanas propiciaram uma explosão de informações que demonstram que o endotélio participa ativamente da manutenção da homeostase cardiovascular. O papel do endotélio vascular é especialmente prominente na regulação da permeabilidade da membrana, do transporte lipídico, do tonus vasomotor, da coagulação, da fibrinólise, da inflamação e da sustentação da estrutura da parede vascular. Isto ocorre pela regulação das funções mediante agentes biologicamente ativos derivados do endotélio, sob a forma de proteinas localizadas na superfície celular ou de fatores localmente secretados, que exercem efeitos opostos, destinados a acentuar ou diminuir o grau de vasoconstrição, promover ou prevenir a coagulação, acentuar ou impedir a adesão plaquetária e leucocitária, ou alterar a forma da parede arterial, mediante a liberação de fatores do crescimento e da matriz extracelular [2-6].
No estado quiescente, as funções dinâmicas da célula endotelial agem em sincronia, para promover o fluxo sanguíneo. A observação mais importante dos últimos anos foi a constatação de que as células endoteliais são extremamente sensíveis aos estímulos capazes de produzir injúria [7]. Estes estímulos incluem a hipóxia, a exposição às citocinas, endotoxinas, colesterol, nicotina ou à injúria física, sob a forma de manipulação cirúrgica ou de alterações das forças hemodinâmicas. Em resposta à essas formas de injúria, as células endoteliais sofrem profundas modificações que induzem a sua participação na resposta inflamatória. Esta resposta, também denominada ativação da célula endotelial, altera o balanço dos fatores do endotélio e, desse modo, acentua a vasoconstrição, a coagulação, a adesão de leucócitos e a proliferação das células musculares lisas [8]. Embora estas alterações pro-inflamatórias, pró-coagulantes e fibroproliferativas certamente constituam mecanismos de proteção, quando os estímulos são muito severos ou persistentes, podem desencadear uma resposta exacerbada, capaz de produzir lesão tissular, alterações das funções de diversos órgãos e uma resposta fibroproliferativa anormal [7].
FORMA E FUNÇÃO VASCULAR NORMAL
A função vascular normal é um processo dinâmico, resultado da interação entre as camadas da parede do vaso e os elementos do sangue circulante. A parede do vaso é constituída de três camadas distintas: a adventícia, a média e a íntima. A adventícia e a média compõem o suporte estrutural da parede e são importantes na sua remodelagem. A íntima é revestida pelo endotélio, situado sobre uma membrana basal e uma matriz sub-endotelial. Embora consista de uma camada fina e aparentemente inerte, o endotélio tem profunda influência na forma da parede do vaso e na função de todo o sistema cardiovascular. Apesar de constituir apenas 1% da massa do corpo, o endotélio tem uma superfície de aproximadamente 5.000 m2 [9]. Em virtude da sua posição estratégica entre o sangue e o interstício, o endotélio está na posição singular de regular os eventos de ambas as naturezas, intravascular e extravascular. Talvez a função mais conhecida da célula endotelial seja a barreira da permeabilidade, pela qual regulam-se as as trocas e o transporte ativo de substâncias na parede arterial. A troca de substâncias através a barreira capilar, ocorre mediante transcitoses inespecíficas e pelo transporte ativo e passivo entre as células [9]. Quando este equilíbrio quebra, como ocorre nos estados inflamatórios difusos, há maior perda líquida através dessa barreira, que resulta em edema intersticial e alteração funcional de alguns órgãos fundamentais.
Além de regular a permeabilidade, o endotélio participa ativamente na regulação da estrutura dos vasos, em resposta às alterações do ambiente local. O endotélio fabrica e secreta fatores de crescimento e fatores inibidores que regulam a estrutura da parede vascular. Através da produção e secreção de moléculas como o fator de crescimento derivado das plaquetas, o fator de crescimento básico dos fibroblastos, o fator de crescimento semelhante à insulina e a interleucina-1 (IL-1), as células endoteliais regulam a manutenção do colágeno e dos proteoglicanos da membrana basal em que repousam [10]. A remoção do endotélio induz a resposta proliferativa das células musculares lisas subjacentes, sugerindo que fatores liberados pelo endotélio funcional são habitualmente responsáveis pela inibição da proliferação descontrolada das células musculares lisas. Importantes inibidores do crescimento produzidos pelo endotélio incluem a heparina, sulfatos de heparina e fator B transformador do crescimento [2]. O estudo dos estímulos excitantes e inibidores desse processo é uma área particularmente fértil da pesquisa em biologia vascular, em virtude das suas implicações na função vascular, em vários estados patológicos.
Existe uma variedade de condições patológicas comuns aos pacientes de cirurgia cardiovascular, que resultam da função vascular comprometida. Estas condições patológicas, tais como vasoespasmo agudo, trombose e fibrinólise, adesão de neutrófilos e fibroproliferação tem vários aspectos comuns mas, serão considerados separadamente.
DISFUNÇÃO VASOMOTORA
O endotélio produz substâncias que atuam local e remotamente, para influenciar o tono vascular. Estas substâncias incluem fatores relaxantes tais como o óxido nítrico (NO), a prostaciclina e a adenosina, que trabalham em conjunto para promover a patência vascular, dilatando os vasos e impedindo a trombose. Adicionalmente, o endotélio produz fatores que promovem o aumento do tonus vascular, tais como a endotelina, leucotrienos e angiotensina II. A maioria dos pacientes com doença coronariana avançada, encaminhados para revascularização do miocárdio apresentam deficiência do controle vasomotor. A capacidade das células endoteliais produzirem fatores relaxantes reduz-se com a idade avançada, diabetes mellitus, hipertensão, uso crônico de nicotina, hipercolesterolemia e aterosclerose, sugerindo um link direto entre a capacidade de sintetizar prostaciclina, NO e adenosina na parede vascular e a vulnerabilidade a episódios de trombose, hipertensão e aterogênese [11]. As condições intra e pós-operatórias podem contribuir para a disfunção vasomotora. Em resposta à injúrias como a circulação extracorpórea, a injúria da isquemia-reperfusão e a manipulação direta, as células endoteliais não apenas perdem sua habilidade de promover vasodilatação, mas também produzem substâncias vasoconstritoras potentes, como a endotelina, o tromboxano A2 e a angiotensina II [12]. Estímulos especificamente nocivos que induzem vasoconstrição pela perda destas substâncias incluem o estiramento (distensão), a hipóxia, a hiperpotassemia, as citocinas e os metabolitos do ácido aracdônico. A injúria da célula endotelial, secundária à hipóxia e à exposição às citocinas, causa a produção de radicais superóxido que exercem um acentuado efeito no aumento do tonus vascular pela inativação do NO. Experiências com células endoteliais em culturas, demonstraram um aumento de 4 a 8 vêzes na liberação de endotelina, em resposta à baixa tensão de oxigênio [13]. Os rins são cerca de 10 vêzes mais sensíveis aos efeitos da endotelina do que os outros órgãos, sugerindo que a injúria da célula endotelial pode ter participação no desenvolvimento da insuficiência renal, nos estados de injúria aguda. Alterações na reatividade vascular também tem efeitos deletérios múltiplos na função cardíaca per-operatória. O aumento da reatividade vascular pode predispor ao espasmo coronário, espasmo dos enxertos de artéria mamária interna ou à não reperfusão, levando à isquemia miocárdica aguda [14,15]. Os esforços para substituir o NO, a prostaciclina ou a adenosina, durante a isquemia/reperfusão, parecem possuir um efeito citoprotetor [16].
COAGULAÇÃO
Em virtude da sua localização entre o sangue circulante e o interstício, o endotélio vascular deve ser uma superfície anticoagulante, em condições basais [4]. Para manter o sangue no estado líquido o endotélio possui múltiplos mecanismos que impedem a coagulação. Em primeiro lugar, a célula endotelial é uma das únicas células que não produz ou secreta o fator tissular, uma proteina responsável pela ativação da via extrínseca da coagulação. A maioria das demais células, especialmente nas camadas sub-endotelial e íntima, produzem o fator tissular, que constitui um importante mecanismo na formação do coágulo nos locais de injúria [17]. O segundo mecanismo anticoagulante derivado do endotélio é a secreção local contínua de substâncias vasoativas solúveis, tais como o NO, a prostaciclina e a adenosina, que mantém vasodilatação e inibem a agregação e adesão plaquetárias. Um mecanismo adicional é a expressão de heparina na superfície endotelial, que liga-se à trombina, para reduzir a clivagem do fibrinogênio em fibrina. Se algum coágulo é formado, a expressão endotelial de ativador do plasminogênio tissular cataliza a conversão do plasminogênio em plasmina, que promove a lise local do coágulo de fibrina [4]. O último mecanismo antitrombótico natural involve a trombomodulina. A trombomodulina é uma proteina ligada à membrana celular na superfície das células endoteliais. Esta forma um complexo (na proporção de 1:1), com a trombina que ativa a proteina C para formar proteina C ativada. Na presença de seu co-fator, a proteina S, o complexo proteina C ativada-trombomodulina-trombina inibe a coagulação pela clivagem dos fatores VIIIa e Va.
Embora provavelmente existam muitas causas de coagulação anormal associada à cirurgia cardíaca, as alterações no ambiente intravascular durante a circulação extracorpórea promovem alterações profundas no estado de coagulação do endotélio. Estas alterações tem um impacto na propensão ao sangramento ou à trombose, após uma cirurgia cardiovascular. Imediatamente após o início da perfusão ocorre um aumento rápido nos níveis circulantes do ativador tissular do plasminogênio [18]. O ativador tissular do plasminogênio que é estocado e liberado pelas células endoteliais, cataliza a formação de plasmina à partir do plasminogênio, que atua diretamente para lisar os coágulos. A liberação do ativador tissular do plasminogênio em conjunto com a hemodiluição, a disfunção plaquetária e a heparinização, levam à dificuldades na coagulação do sangue em alguns pacientes submetidos à CEC [19]. Além da sua função dinâmica na prevenção da coagulação, o endotélio promove a coagulação em resposta à injúria, local ou remota. A ativação da célula endotelial pelas citocinas inflamatórias resulta no aparecimento do fator tissular na superfície das células endoteliais, em duas horas [20-26]. Observações experimentais demonstram que os mediadores inflamatórios circulantes nos pacientes de cirurgia cardíaca, como o fator de necrose tumoral, IL-1 e o fragmento 5a do complemento, induzem a expressão do fator tissular nas células endoteliais em cultura e podem explicar porque existe uma extensa ativação da via extrínseca da coagulação, nos pacientes submetidos à CEC [21-27]. A expressão difusa de fator tissular possivelmente resulta em depleção dos fatores de coagulação circulantes, o que ocorre quando a coagulação disseminada é desencadeada [28]. Nestas circunstâncias, depósitos de fibrina acumulam na circulação microvascular e as plaquetas se reduzem, pela sua retenção nas malhas de fibrina [19, 28-30]. No pós-operatório, quando os níveis do ativador do plasminogênio tissular são reduzidos e os fatores de coagulação recuperam-se, há transformação de um estado de consumo e fibrinólise, para um estado em que há tendência à coagulação [18]. A caracterização dos eventos que resultam na liberação do ativador do plasminogênio tissular e expressão do fator tissular após a inflamação, pode permitir o desenvolvimento de técnicas para modular e, em consequência, prevenir, algumas das alterações que complicam as operações cardiotorácicas.
INTERAÇÃO NEUTRÓFILO-CÉLULA ENDOTELIAL
O recrutamento de neutrófilos da corrente sanguínea para locais de injúria extravascular é um evento crítico na defesa do hospedeiro contra infecções e na reparação de tecidos danificados [31]. Este processo, provavelmente ao longo da evolução das espécies, tornou-se localizado e benéfico na luta contra a inoculação de bactérias. Quando os sinais são difusos, como ocorre no choque, na sepsis ou na circulação extracorpórea, pode existir a ativação endotelial em múltiplos órgãos, que resulta em ampla secreção ou expressão de moléculas que promovem a aderência de neutrófilos. Por causa do amplo potencial do sistema de defesa do organismo, o endotélio possui propriedades antiadesivas endógenas, que previnem contra a adesão de leucócitos. A célula endotelial inativada não possui as moléculas de aderência leucocitária, necessárias à adesão imediata. O óxido nítrico é um potente mediador antiadesivo que previne a adesão neutrófilo-célula endotelial, em condições basais. A importância do NO na prevenção da adesão leucocitária, em condições fisiológicas normais, foi demonstrada, quando a N-monometil-arginina foi usada para bloquear a produção de NO, resultando em um aumento de 15 vêzes na adesão de neutrófilos [32]. A prostaciclina e a adenosina tem efeitos similares na inibição da adesão [33].
O endotélio normal produz substâncias que repelem os leucócitos circulantes; a injúria da célula endotelial, entretanto, resulta na expressão de moléculas de adesão leucocitária, que permitem ao endotélio concentrar neutrófilos nas áreas de injúria [34]. Ao examinar esse fenômeno ao nível celular, Bevilacqua e colegas [35] notaram que as células endoteliais em cultura produzem proteinas que causam a adesão de leucócitos em resposta ao fator de necrose tumoral ou IL-1. Estas proteinas, que habitualmente não estão presentes no estado de repouso mas são facilmente indutíveis quando as células são ativadas, tem sido caracterizadas como moléculas de adesão leucocitária. Embora os mecanismos exatos que governam o início e o término desses processos não sejam conhecidos, parece que o processo de ativação da célula endotelial é auto-limitado, porque muitos dos agonistas que ativam a célula endotelial também induzem a produção de fatores inibitórios, como o fator inibitório kappaB, que participa do processo interrompendo aquela resposta [36].
A Resposta Inflamatória Sistêmica à C.E.C.
A adesão neutrófilo-célula endotelial em níveis sistêmicos é mais evidente na resposta inflamatória generalizada, que resulta da liberação dos produtos de degradação do complemento e de citocinas, após o contato do sangue com os condutos artificiais da circulação extracorpórea. As alterações pró-inflamatórias da célula endotelial promovem o sequestro de leucócitos, resultado da sua adesão aos leitos capilares dos rins, fígado, cérebro, extremidades e, mais notadamente, coração e pulmões. O fragmento 5a, subproduto da ativação do complemento, modera a fase precoce da inflamação, que inicia a expressão de moléculas de adesão leucocitária na superfície das células endoteliais ativadas, após a CEC [37]. As citocinas liberadas pelas células endoteliais isquêmicas e pelos macrófagos tissulares no coração, nos pulmões e em outros órgãos, mediam a fase seguinte da aderência dos neutrófilos [38]. Isto resulta na resposta à citocina da CEC, evidente pelos níveis aumentados de fator de necrose tumoral, IL-1, IL-6, IL-8 e radicais livres, provavelmente liberados pelas células endoteliais lesadas, pelos neutrófilos e pelos macrófagos [39-43]. Recentemente, moléculas de aderência (E-selectina, molécula de adesão intracelular, P-selectina) foram demonstradas em fragmentos de biópsia de músculos esqueléticos coletadas durante o curso da CEC, indicando que as observações das culturas "in vitro" de células endoteliais correlacionam, como se esperava, com os fenômenos clínicos [37,44].
Injúria da Isquemia/Reperfusão
A resposta inflamatória sistêmica pode ter um efeito particularmente deletério no coração em que existe um insulto adicional produzido pela isquemia miocárdica, durante a parada eletromecânica [45,46]. A isquemia miocárdica que ocorre em muitos pacientes no pré-operatório e como resultado da parada cardioplégica durante a CEC, ativa o endotélio vascular a recrutar neutrófilos, que acentuam a injúria após a reperfusão com sangue oxigenado [47]. Mallory [48] primeiro descreveu a infiltração de leucócitos após a oclusão coronariana aguda em material de autópsia. Este padrão de injúria, conhecido como injúria da isquemia-reperfusão, tem sido reproduzido experimentalmente em numerosos estudos, que tem demonstrado que, quando um tecido isquêmico é reperfundido com sangue oxigenado, os neutrófilos acumulam rapidamente no tecido infartado [49,50]. Quando os neutrófilos aderem ao endotélio lesado por hipóxia, a disfunção mediada pelos leucócitos parece resultar da liberação de uma variedade de substâncias tais como radicais livres derivados do oxigênio, tromboxanos, leucotrienos, elastases e proteases que rompem as membranas celulares e comprometem a função miocárdica [51].
Os mecanismos celular e molecular da adesão neutrófilo-célula endotelial na injúria da isquemia/reperfusão estão melhor esclarecidos. Recentemente Shreeniwas e colegas [52] demonstraram a indução de moléculas de aderência dos neutrófilos na superfície das células endoteliais tornadas hipóxicas e então reoxigenadas, em culturas. É interessante que os neutrófilos não aderem ao endotélio lesado por hipóxia até que as células sejam reoxigenadas, o que enfatiza a importância da re-oxigenação nesta síndrome. Estudos com anticorpos monoclonais contra moléculas de aderência que bloqueiam muitos dos efeitos deletérios da reperfusão, sustentam a importância das moléculas de aderência dos neutrófilos na injúria da isquemia/reperfusão [53-57]. Novas abordagens dos mecanismos da injúria da isquemia/reperfusão provenientes do estudo de culturas de células endoteliais tornadas hipóxicas surgem na literatura; alguns deles podem conduzir a novas opções terapêuticas num futuro não muito distante.
Preservação de Órgãos
Uma outra área da cirurgia cardiotorácica em que a aderência neutrófilos-células endoteliais pode ser importante é o campo dos transplantes. Shumway e cols. reconheceram que a preservação eficaz dos enxertos deveria ser um aspecto importante dos transplantes [58]. O seu trabalho pioneiro demostrou que o coração poderia tolerar a anóxia por uma hora à baixas temperaturas, estabelecendo a hipotermia tópica como o esteio da preservação cardíaca nas últimas três décadas. Esta abordagem, primeiro demonstrada no laboratório e depois na sala de operações, reduziu significativamente a mortalidade durante as operações intra-cardíacas e permitiu o uso de doadores distantes para aumentar a disponibilidade de órgãos, coração e pulmões, para transplantes [59]. Apesar dos benefícios da hipotermia, a função imediata dos enxertos ainda é seriamente limitada pela injúria da isquemia-reperfusão, especialmente quando o tempo de isquemia se aproxima de 6 horas. Nestas circunstâncias a função miocárdica comprometida pode levar à dependência de suporte inotrópico ou mecânico. Os esforços para melhorar a preservação de órgãos, tradicionalmente, dirigem-se à repleção de substratos. Recentemente, a atenção dos pesquisadores está voltada para a injúria endotelial, como um fonte potencial de disfunção após a preservação cardíaca. Bando e colegas [60,61] removeram os leucócitos por filtração mecânica, no doador e no receptor e demonstraram que a tolerância à isquemia é maior que a conferida pelo simples resfriamento. Isto consubstancia a observação de que a ativação do endotélio isquêmico é importante na atração dos neutrófilos para o endotélio dos enxertos. Byrne e colegas [55,62] encontraram que a adição de anticorpos monoclonais antiadesivos à solução da universidade de Wisconsin melhorou acentuadamente a sua propriedade de prevenir a injúria da isquemia-reperfusão, possibilitando prolongar o intervalo isquêmico para 15 horas, em um modelo de transplante cardíaco. A melhor compreensão dos mecanismos da injúria endotelial hipóxica, especialmente nas células hipotérmicas, pode permitir o desenho de novos estudos para melhorar a qualidade da preservação de corações e pulmões antes dos transplantes.
HIPERPLASIA DA ÍNTIMA EM REPOSTA À INJÚRIA DA CÉLULA ENDOTELIAL
O sucesso a longo prazo dos enxertos aorto-coronárias é limitado pelo desenvolvimento de hiperplasia da íntima nos locais de injúria dos vasos. Todas as formas de reconstrução arterial causam algum grau de injúria da célula endotelial. A coleta e manipulação do enxerto e a construção das anastomoses são causas comuns de lesão vascular nos pacientes de cirurgia cardiovascular. A resposta da íntima à injúria é caracterizada por fibroproliferação sub-endotelial e pela formação de uma neo-íntima [5]. Esta resposta hiperplástica da íntima é parte do processo reparativo que ocorre em todas as artérias, após a injúria [5,63]. Esta resposta é importante porque a formação de neo-íntima ocorre em todas as artérias, em consequência à uma variedade de injúrias que incluem o trauma direto, construção de anastomoses, dilatação com catéter-balão ou rejeição pós-transplante. Em algumas circunstâncias, contudo, a injúria é excessiva e causa uma proliferação exagerada da neo-íntima e perda dos anticoagulantes naturais, que resulta em redução do lumen, redução do fluxo sanguíneo e, em alguns casos, trombose [63].
O estudo intensivo desse processo levou à melhor compreensão da patogênese da hiperplasia da íntima. Parece que existem 3 fases de resposta da íntima à injúria. A primeira fase consiste de proliferação do músculo liso da média e começa cerca de 24 horas após a injúria do endotélio. Quando o endotélio é removido, as plaquetas aderem à parede do vaso, espalham-se e perdem seus grânulos. Substâncias mitogênicas são liberadas pelas plaquetas ativadas e aderentes, tais como o fator de crescimento plaquetário, que estimulam a migração de células musculares lisas para a íntima [64]. Quando as células endoteliais e as células musculares lisas sofrem injúria, outras substâncias mitogênicas, como o fator básico de crescimento dos fibroblastos, são liberados, que estimulam uma resposta proliferativa dos músculos lisos na camada média [64]. Após 3 a 14 dias de proliferação na média, a migração de células musculares lisas da média para a íntima se inicia, para formar a neo-íntima. Uma vez formada a neo-íntima, as células musculares lisas proliferam rapidamente para formar uma camada espessa que, eventualmente, pode obstruir o lumen.
INJÚRIA CRÔNICA DA CÉLULA ENDOTELIAL
A aterosclerose é a principal causa de morte no mundo ocidental e a principal causa de encaminhamento de pacientes para cirurgia cardíaca. Em 1973 Ross e Glomset [65] propuseram que a aterosclerose resultaria de uma resposta da célula endotelial à injúria crônica que levaria à adesão e migração de neutrófilos, linfócitos, plaquetas e macrófagos para o sub-endotélio. Subsequentemente estas células orquestrariam os eventos moleculares e celulares que levam à redução progressiva do diâmetro do lumen arterial. Fontes comuns de injúria crônica da célula endotelial incluem a nicotina, hipertensão, diabetes e hipercolesterolemia, todos fatores de risco independentes para o desenvolvimento de aterosclerose. Além disso, a rejeição crônica aos transplantes está associada à uma injúria difusa das células endoteliais que leva à uma forma acelerada de aterosclerose difusa. Investigadores demonstraram que estas formas de injúria da célula endotelial convergem em diversos mecanismos que levam ao aumento da massa da parede vascular. Estes mecanismos comuns resultam dos efeitos nocivos da adesão de plaquetas, neutrófilos, linfócitos e monócitos à camada de células endoteliais danificadas.
As células endoteliais são singulares; crescem como uma única camada monocelular e interrompem a proliferação em resposta à inibição pelo contato [7]. Quando são danificadas elas tendem a proliferar e alongar-se, para restabelecer a continuidade do endotélio [7]. Nos modelos de injúria crônica, formulou-se a hipótese de que as células endoteliais perdem a sua capacidade de replicar-se, resultando uma área de exposição sub-endotelial crônica, que permite a adesão de neutrófilos, linfócitos, plaquetas e macrófagos e a proliferação de células musculares lisas para recobrir a área desnuda [10]. Observações experimentais confirmaram que estas células inflamatórias ativam-se e liberam substâncias que atraem as células musculares lisas. A disrupção do endotélio pode ser especialmente marcada em áreas específicas como os ramos e bifurcações, em que lesões proliferativas avançadas são frequentemente encontradas [66]. Níveis elevados de glicose, como visto no diabetes, podem impedir a replicação endotelial e acelerar a morte das células endoteliais em cultura [67]. Formas crônicas de injúria da célula endotelial podem resultar na prolongada expressão de moléculas de adesão de leucócitos que atraem os neutrófilos. A presença dos leucócitos na parede do vaso pode levar à liberação de radicais livres de oxigênio, proteases e citocinas que acentuam a disrupção do sub-endotélio e causam proliferação das células musculares. Na aterosclerose há evidências de redução do NO em resposta à acetilcolina [68]. Isto pode contribuir para o espasmo vascular com aumento do atrito da corrente sanguínea, perda do efeito antimitogênico do NO que reduz a proliferação de células musculares, aumento da adesividade plaquetária e trombose. O mecanismo da produção reduzida de NO na aterosclerose ainda é objeto de investigação, mas pode depender em parte, dos efeitos diretos de lipoproteinas de baixa densidade [69].
Com o tempo, estas células inflamatórias acumulam em resposta à injúria crônica da célula endotelial. As placas de aterosclerose desenvolvem-se iniciando como estrias de gorduras que consistem de macrófagos repletos de lipídeos ou células espumosas [7]. Estas estrias de gordura progridem para placas fibrosas. A progressão das lesões de aterosclerose é, desse modo, marcada pelo acúmulo de camadas alternadas de células musculares lisas e macrófagos contendo lipídeos [10]. As células espumosas e as células musculares lisas penetram no lumen arterial e comprometem o fluxo sanguíneo [7]. Nas lesões tardias as camadas de tecido fibroso e células musculares lisas envolvem um centro de gordura e necrose [10]. Estas placas podem romper facilmente, o que leva à oclusão por trombos plaquetários, infarto agudo do miocárdio e morte súbita [7].
CONCLUSÕES
Várias formas de injúria das células endoteliais ocorrem comumente e podem alterar o curso dos pacientes de cirurgia cardiovascular, aguda ou cronicamente. Em virtude do grande impacto da disfunção da célula endotelial em pacientes com doenças cardiovasculares, temas relativos à biologia endotelial estão no "front" das pesquisas que deverão influir na prática atual e futura da cirurgia cardiotorácica. Descobertas recentes no campo da biologia vascular permitiram a melhor compreensão da patogenia de muitas das complicações agudas e crônicas dos pacientes submetidos á operações cardiovasculares e possibilitaram novas abordagens terapêuticas. A compreensão da resposta da célula endotelial á injúria é essencial na apreciação do papel que sua disfunção desempenha nos cursos pré per e pós-operatório de praticamente todos os pacientes de cirurgia cardiovascular.
Esta revisão tem o objetivo de servir de introdução aos grandes temas da biologia vascular, que são importante para o cirurgião cardiovascular. Os papéis do endotélio na regulação do tonus vascular, coagulação, adesão de leucócitos e proliferação de células musculares lisas foram destacados em virtude da importância crítica que estas defesas do hospedeiro tem na recuperação ou no falecimento de nossos pacientes. Embora sejam todos unificados pelo fator comum, a resposta da célula endotelial à injúria, o estudo de cada um dos tópicos tornou-se uma área específica do conhecimento que deve ser melhor analisada individualmente. Nas revisões que seguem esse trabalho nós pesquisamos a literatura corrente que detalha a importância da injúria da célula endotelial na cirurgia cardiovascular, em cada uma das áreas destacadas. Os autores focaram seu trabalho na análise do impacto da injúria da célula endotelial na evolução pré, per e pós-operatória dos pacientes operados. Nós esperamos que estas revisões sirvam como pontos de referência para os cirurgiões cardiovasculares, na medida em que avaliam as novas pesquisas e as novas terapias que emergem do estudo do endotélio em resposta às operações cardiovasculares.
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